sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

A morte de Getúlio Vargas


Manifestação em São Paulo, após a informação da morte de Getúlio Vargas
Fonte A Tribuna

DEZENOVE DIAS QUE ABALARAM O BRASIL
Rio, 24 – (Especial) – Foram dezenove dias que abalaram o Brasil, criando um clima tremendamente perigoso. E quando o povo brasileiro começava a respirar aliviado, após 48 horas dramáticas, o gesto final do sr. Getúlio Vargas veio novamente sacudi-lo eemocioná-lo terrivelmente.

Da madrugada do dia 5, quando tombou sem vida o major Rubens Florentino Vaz, à madrugada do dia 24, quando se encontrou a solução pacífica e constitucional para a crise político-militar que se prolongava e cada vez mais se agravava, a Nação viveu dias de angustiosa expectativa, temerosa de que a intransigência de uma e o faccionismo de outros se sobrepusessem, ao bom senso e ao patriotismo dos responsáveis pela situação.

O próprio ritmo das atividades econômicas se perturbou, agravando, ainda mais, as dificuldades que vinham assustando o país.

O atentado da rua Toneleros revestiu-se, desde o primeiro instante, de feição nitidamente política. O visado era um jornalista de oposição, excessivo algumas vezes no tom de sua campanha, mas imbuído de inegável objetivo renovador e que, durante meses, vinha zurzindo, com o látego da sua crítica implacável, pessoas da família presidencial e altas figuras da administração. Quis o destino que tombasse morto o major Vaz, herói da FAB, homem bom e homem puro, alheio às lutas políticas, embora solidário, pelo dever do patriotismo, com a luta saneadora desenvolvida pelo diretor de “Tribuna da Imprensa”.

A quem poderia interessar o atentado?

A quem poderia lucrar o silêncio do sr. Carlos Lacerda?

Desde o primeiro instante voltaram-se as atenções para algumas figuras da intimidade do sr. Getúlio Vargas.

Apesar disso, não se chegava a admitir que o crime tivesse sido tramado dentro do próprio Catete e que entre os seus próprios executores se contassem elementos da guarda pessoal do presidente da República.

A morte do major Vaz, no entanto, levantara uma impetuosa onda de revolta entre os seus companheiros de farda.

O Governo, fraco e sem autoridade, cedeu, entregando a orientação das diligências a uma comissão de oficiais da FAB. Suprindo com entusiasmo e dedicação o que lhe faltava em técnica policial, esse grupo de oficiais, auxiliado por centenas de outros que espontaneamente ofereceram a sua colaboração, conseguiu rapidamente descobrir a trama do crime, desde o início do seu preparo à sua execução, pretendendo todos os implicados diretos, e conhecer indícios veementes dos mandantes.

E, à medida que os fatos iam sendo apurados, toda uma torrente de acontecimentos, os mais graves, estarreciam a opinião pública.

A crise política agravou-se consideravelmente à medida as intimidades do Catete eram postas a olho nu; que a influência do famigerado Gregório Fortunato se estadeava para espanto geral; que a Nação tomava conhecimento das curvaturas de certos áulicos ao guarda-costas todo poderoso.

De toda a parte, das colunas da imprensa, da Tribuna da Câmara e do Senado, através do pronunciamento da vida pública, a opinião pública se manifestou de maneira inequívoca pela renúncia do presidente, solução constitucional, que nenhum abalo traria ao funcionamento normal das instituições.

O sr. Getúlio Vargas, porém, manifestou-se irredutível, já, certamente, com a trágica resolução de matar-se, formalizada em seu espírito. Não renunciaria, estava disposto a cumprir o mandato popular que lhe fora outorgado a 3 de outubro de 1950.

Todas as fórmulas que lhe foram sugeridas não encontraram sua acolhida. Enquanto isso, crescia a tensão nas Classes Armadas e se tornava viável, papável o perigo da indisciplina, pela sofreguidão dos elementos jovens, desejosos de uma solução imediata.

O sr. Getúlio Vargas se apegava à aparência do Poder, intransigente na defesa de um princípio de autoridade que lhe escapara desde o dia em que a Polícia fora posta de lado uma função da sua exclusiva competência; desde o momento em que os responsáveis pelo atentado foram buscados dentro do próprio Catete.

O sr. Getúlio Vargas, de ordinário tão lúcido e perspicaz, não quis ver a situação que, no entanto, a todos se apresentava meridianamente clara.

Crendo-se vítima da sanha dos seus adversários, quando foi muito mais de seus próprios erros e dos desmandos de sua camarilha, o presidente da República negou-se até o último instante a aceitar a solução indicada pelos acontecimentos e aconselhada pelos elementos mais responsáveis. Veio, afinal, depois de algumas horas de intensa dramaticidade, o licenciamento do chefe do Governo, solução aceita pelos chefes militares e, três ou quatro horas depois, o gesto trágico de s. excia., inteiramente inesperado e em contradição flagrante com o seu temperamento frio, com a sua comprovada capacidade de dominar as emoções.

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No transcurso desses trágicos 19 dias, que abalaram o Brasil, cumpre destacar o papel patriótico das Forças Armadas, que através de seus chefes naturais, tudo fizeram em prol de uma solução legal, dentro do estrito respeito à Constituição.

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Nas suas sucessivas reuniões, nos seus repetidos comunicados, os chefes do Exército, da Aeronáutica, e da Marinha deixaram sempre patente o firme propósito de levar até o fim as investigações, de punir os culpados, fosse qual fosse a sua categoria, e de ao mesmo tempo, resguardar o regime legal. E cumpriram a sua promessa.

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A respeito do gesto trágico do sr. Getúlio Vargas, é cedo ainda para um pronunciamento. O certo é que seu suicídio traumatizou terrivelmente a opinião pública, envolvendo no mesmo abalo amigos e adversários.

Fonte: Jornal A Tribuna - 25 de agosto, 1954.













Postado por Paulo Renato Alves









20 de fevereiro, 2009.

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