sábado, 28 de fevereiro de 2009

Portugal - Revolução dos Cravos - Primeira Parte

Foto Jornal A Tribuna

CAETANO DEPOSTO, SPINOLA ASSUME
As Forças Armadas de Portugal em protesto contra as guerras que já duram 13 anos em suas colônias africanas e pela falta de liberdades democráticas, sublevaram-se ontem contra o governo do primeiro ministro Marcelo Caetano e, depois de um golpe sem derramamento de sangue, anunciaram que haviam triunfado.

Uma multidão calculada em vários milhares de pessoas assistiu ao último ato de insurreição que durou 12 horas, quando se anunciou pelos alto-falantes instalados no Palácio do Carmo, no centro da cidade, a rendição de Caetano e dos membros do governo. O palácio é um antigo mosteiro que foi convertido em posto de comando da Guarda Nacional Republicana que apoiava Caetano.

“Informamos ao país que o ex-primeiro-ministro Caetano e membros do seu governo se renderam. As Forças Armadas ocuparam o governo”, afirmou uma transmissão dos rebeldes, que anunciaram um programa de democratização e prometeram eleições livres, assegurando que uma Junta Militar governará o país até que se possam realizar eleições.

Porta-vozes oficiais indicaram pela manhã e nas primeiras horas da tarde que o governo estava tentando dominar a situação. Mas não se pode localizar nenhum informante oficial depois que os rebeldes anunciaram seu triunfo. Os rebeldes anunciaram que o presidente e homem forte do país, Américo Thomaz, de 79 anos, estava detido em posto de comando da Polícia Militar.

Os comunicados emitidos pelo movimento militar não indicavam quem dirigia a sublevação. Porém, quando Caetano rendeu-se, os rebeldes revelaram, por meio de alto-falantes, que o poder havia sido entregue ao general Antônio Spínola, o herói das guerras africanas de Portugal, que Caetano afastara-se de seu posto há dois meses, por afirmar que a vitória militar contra os movimentos guerrilheiros era impossível e por pedir reformas democráticas.

O general Spínola atravessou uma multidão de vários milhares de pessoas que o aclamavam para ingressar no Palácio do Carmo e aceitar a rendição de Caetano. A multidão gritava: “Vitória, vitória” e “Liberdade, ganhamos a liberdade”.

O afastamento de Spínola, que ostenta muitas condecorações e foi comandante militar da Guiné Portuguesa, provocou um fracassado golpe militar de jovens oficiais no dia 17 de março. Sua posição contra o governo ele explicou em um livro intitulado “Portugal e o Futuro”, o que o tornou o herói dos opositores ao regime de Caetano-Thomaz, embora Spínola tenha uma ideologia que dista muito de ser liberal no sentido ocidental.

A revolta de ontem começou às 4 horas da manhã, em Lisboa, quando tanques e outros blindados rumaram pela Avenida da Liberdade em direção ao terreiro do Paço, onde está localizada a maioria dos ministérios. Explosões e tiros foram ouvidos na parte central da cidade, quando os rebeldes começaram a eliminar bolsões de resistência das forças leais ao governo de Marcelo Caetano. Testemunhas disseram que diversas pessoas morreram ou foram feridas, mas não há, por ora, nenhuma informação oficial sobre baixas.

Caetano e outros altos funcionários do governo buscaram refúgio no Palácio do Carmo, desafiaram a inteligência rebelde da rendição e tentaram repelir os atacantes. Os revoltosos cercaram o prédio e abriram fogo com metralhadoras, um canhão leve e um tanque. O ataque foi imediatamente repelido.

Entretanto, os rebeldes ressaltaram que tinham dinamite para fazer voar o prédio e poucos minutos depois os funcionários ali refugiados começaram a sair para se render. Então, os alto-falantes colocados no edifício passaram a anunciar que Caetano, que permaneceu no interior do palácio, havia renunciado.

Os rebeldes informaram que estavam “satisfeitos por não ter sido usada a força no palácio”. A transmissão pediu à população que permanecesse em suas casas durante a noite, acrescentando que “esperamos que a situação esteja normalizada dentro de poucas horas”.

Logo após a deposição oficial do antigo governo português, dois homens deixavam o quartel. O general Spínola com a mesma postura de minutos antes, tomava seu carro, e Marcelo Caetano, acompanhado por oficiais rebeldes, era levado preso para outra unidade militar.

Marcelo Caetano e todos os integrantes destacados de seu governo concordaram que deveriam exilar-se incondicionalmente na Ilha da Madeira. A agência de notícias oficial – ANI – informou que o ex-primeiro-ministro e vários de seus auxiliares diretos partiram do aeroporto de Lisboa para Madeira ontem à noite. “Foram despedidos com todas as honras militares e entre os que compareceram no aeroporto para dizer-lhes adeus estava o general Spínola”, disse a agência.

Brasil na expectativa
O Governo brasileiro não adotara nenhuma posição relativa aos acontecimentos de Portugal antes de ter uma completa definição da situação gerada pelas forças rebeldes, já que até deixar o Palácio do Planalto, às 18 horas de ontem, os relatórios encaminhados pelo Itamarati ao presidente Ernesto Geisel, ainda não eram conclusivos.

A posição a ser adotada pelo Brasil, entretanto, será realista e pode tender para o rápido reconhecimento da nova situação em Lisboa, desde que um novo governo se constitua pelas forças rebeldes e exerça, de fato, sua autoridade política sobre Portugal. A situação no Palácio do Planalto durante todo o dia foi de apenas muita expectativa.

Fonte: A Tribuna - 26 de abril, 1975


Postado por Paulo Renato Alves

01 de março, 2009

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